7.11.05
Comunidades Multi-Culturais : A Difícil Convivência
Aqui mesmo, já por diversos vezes, tenho abordado o tema das relações entre Comunidades que partilham o mesmo espaço físico.
Estas relações, desejavelmente de boa convivência, como repetidamente comprovamos, são sempre difíceis, potencialmente conflituosas, sobretudo, quando dimanam de culturas demasiado diferentes, porventura antagónicas, por falta de um quadro comum de valores e referências geralmente aceite e respeitado.
De novo volto a fazê-lo, impelido pelos recentes acontecimentos de Paris e de outras cidades da Pátria da Liberté, Égalité et Fraternité, que vive hoje, mais uma uma vez, horas agitadas, ainda que desta feita por acção de inesperados protagonistas.
As chamadas revoltas urbanas francesas que continuam, ao cabo de quase 15 dias, a ocupar os telejornais das cadeias de televisão internacionais, para espantosa surpresa de muitos, parecem alimentar um certo gosto mórbido por este tipo de fenómenos sociais, como se eles não fossem razoavelmente previsíveis, desde que a Europa, por puro egoísmo, comodismo e oportunismo, decidiu importar – desregradamente – massas de imigrantes, vistas como fonte de mão-de-obra abundante, dócil e barata : o verdadeiro paraíso para Empresários pouco escrupulososos.
Assim permaneceram, na sua mansa e resignada condição, pelo menos, os da primeira leva de imigração, i.e., aqueles que eram estrangeiros e podiam ser expulsos do país acolhedor, em qualquer altura, por prática de infracção grave às leis vigentes. Agora, com os da 2ª e 3ª gerações, já «europeus», a sua repressão, em caso de prevaricação sistemática, torna-se mais complicada. Desde logo, não poderão ser expulsos dos «seus» países adoptivos, façam o que fizerem, digam o que disserem.
Cabe aqui naturalmente questionar por que não fomenta a União Europeia o seu próprio crescimento demográfico, protegendo a família, em primeiro lugar, e auxiliando as famílias numerosas, em segundo, valorizando deste modo a função reprodutiva das suas sociedades, em lugar de recorrer sistematicamente ao expediente da importação maciça de imigrantes de outros continentes, alguns com notórias dificuldades de integração, por serem portadores de culturas muito dissemelhantes e até conflitivas com as dos países de acolhimento, factores que, mais tarde, hão-de gerar os consequentes sentimentos recíprocos de rejeição e, por fim, de revolta.
Curiosamente, muitos destes enfurecidos jovens, quando inquiridos sobre as suas identidades, afirmam não se sentirem franceses, mas marroquinos, argelinos, guineenses, etc., ainda que não manifestem o menor desejo de regressar a estes seus países do coração.
Mas nestes tumultos em terras gaulesas, primeiro que tudo, salta à vista a inépcia do Governo francês em lidar com eles. Com efeito, se apenas ao fim do 10º dia consecutivo de desordem e vandalismo, Monsieur Jacques Chirac se deu conta de que a prioridade está em restabelecer a ordem e a segurança nas cidades francesas, o menos que se pode dizer é que tenha sido lesto na apreensão da realidade.
Com ele, evidentemente, todo o Governo, incluindo o seu famoso Ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, com o pelouro da ordem e da segurança do território. À parte certas declarações suas deveras tonitruantes, algumas, no entanto, pouco adequadas, embora de modo nenhum possam ser entendidas como a causa da violência, a sua eficácia tem sido reduzidíssima, a avaliar pela propagação do fenómeno, desde que designou de escumalha os bandos de desordeiros que semeiam o caos e a destruição nos bairros periféricos das grandes cidades francesas já de si carecidos de equipamentos e infra-estruturas socias, como insistentemente alegam.
Se a linguagem de Sarkozy não primou pela elegância, mesmo atendendo à exaltação do momento, no contexto degradado em que ela se verificou, pior do que isso, é a sua completa inocuidade, com o acúmulo de danos e vítimas desde esse seu momento de enfado e irritação.
Em quase toda a Europa, sobretudo na União Europeia, desde há anos que os factores da desordem social não cessam de se multiplicar, com a inconsciência criminosa dos que têm a responsabilidade de prever as suas consequências.
O chamado mundo moderno, globalizado, que reduz as Nações e os seus cidadãos a meros conjuntos ou segmentos de mercado, tão-só consumidores, não tem encontrado tempo ou razão para se preocupar com este tipo de problemas.
Primeiro, minimiza-os, acha que eles se resolverão com a próxima retomada do crescimento económico; depois, conforma-se com o declínio demográfico dos seus países, encarando a imigração como panaceia universal para a escasez de mão-de-obra, dentro de uma visão julgada pragmática que não vê na população senão um factor de produção necessário para promover o crescimento económico. Melhor ainda se ela se mostrar disponível, barata e sem direitos sociais.
Entretanto, a inconsciência vai-se generalizando. Na dormência do consumo incentivado, ninguém parece importar-se com os tipos de sociedades que se estão a desenvolver. Serão o quê ? Nações ? Comunidades ? Estados ?
Que tipos de sociedades criamos, na base do multi-culturalismo exacerbado, sem respeito por referências comuns ? Onde ficou, que destino levou, o sentimento de pertença a uma Comunidade assente no culto de um passado comum ? Serão exequíveis os Estados baseados em tão dilaceradas Nações, com acirrados ódios entre si, desprovidas de sentimentos de solidariedade recíproca ? Não se justificaria rever cuidosamente as leis da Nacionalidade, no seio da União Europeia ? Que sentido fará chamar «francês» a quem não partilha nenhum traço de identidade cultural com outros franceses, nomeadamente, com os de origem ? A chamada globalização dos mercados terá resposta adequada para estes problemas ?
Eis alguns dos temas que aqui na União Europeia, sobretudo, deveriam constituir prioridade absoluta nas reflexões sociais que os Governantes costumam enaltecer, pelo menos, no plano teórico.
Sirva-nos a nós todos, europeus, cidadãos desta delicada União Europeia, de séria advertência o que se tem passado em França na última quinzena, se queremos evitar a temida confrontação generalizada entre comunidades.
Lembremo-nos de que, pese o precipitado vaticínio do mediático Fuckuyama, ainda não chegámos ao fim da História...
AV_Lisboa, 07 de Novembro de 2005
Estas relações, desejavelmente de boa convivência, como repetidamente comprovamos, são sempre difíceis, potencialmente conflituosas, sobretudo, quando dimanam de culturas demasiado diferentes, porventura antagónicas, por falta de um quadro comum de valores e referências geralmente aceite e respeitado.
De novo volto a fazê-lo, impelido pelos recentes acontecimentos de Paris e de outras cidades da Pátria da Liberté, Égalité et Fraternité, que vive hoje, mais uma uma vez, horas agitadas, ainda que desta feita por acção de inesperados protagonistas.
As chamadas revoltas urbanas francesas que continuam, ao cabo de quase 15 dias, a ocupar os telejornais das cadeias de televisão internacionais, para espantosa surpresa de muitos, parecem alimentar um certo gosto mórbido por este tipo de fenómenos sociais, como se eles não fossem razoavelmente previsíveis, desde que a Europa, por puro egoísmo, comodismo e oportunismo, decidiu importar – desregradamente – massas de imigrantes, vistas como fonte de mão-de-obra abundante, dócil e barata : o verdadeiro paraíso para Empresários pouco escrupulososos.
Assim permaneceram, na sua mansa e resignada condição, pelo menos, os da primeira leva de imigração, i.e., aqueles que eram estrangeiros e podiam ser expulsos do país acolhedor, em qualquer altura, por prática de infracção grave às leis vigentes. Agora, com os da 2ª e 3ª gerações, já «europeus», a sua repressão, em caso de prevaricação sistemática, torna-se mais complicada. Desde logo, não poderão ser expulsos dos «seus» países adoptivos, façam o que fizerem, digam o que disserem.
Cabe aqui naturalmente questionar por que não fomenta a União Europeia o seu próprio crescimento demográfico, protegendo a família, em primeiro lugar, e auxiliando as famílias numerosas, em segundo, valorizando deste modo a função reprodutiva das suas sociedades, em lugar de recorrer sistematicamente ao expediente da importação maciça de imigrantes de outros continentes, alguns com notórias dificuldades de integração, por serem portadores de culturas muito dissemelhantes e até conflitivas com as dos países de acolhimento, factores que, mais tarde, hão-de gerar os consequentes sentimentos recíprocos de rejeição e, por fim, de revolta.
Curiosamente, muitos destes enfurecidos jovens, quando inquiridos sobre as suas identidades, afirmam não se sentirem franceses, mas marroquinos, argelinos, guineenses, etc., ainda que não manifestem o menor desejo de regressar a estes seus países do coração.
Mas nestes tumultos em terras gaulesas, primeiro que tudo, salta à vista a inépcia do Governo francês em lidar com eles. Com efeito, se apenas ao fim do 10º dia consecutivo de desordem e vandalismo, Monsieur Jacques Chirac se deu conta de que a prioridade está em restabelecer a ordem e a segurança nas cidades francesas, o menos que se pode dizer é que tenha sido lesto na apreensão da realidade.
Com ele, evidentemente, todo o Governo, incluindo o seu famoso Ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, com o pelouro da ordem e da segurança do território. À parte certas declarações suas deveras tonitruantes, algumas, no entanto, pouco adequadas, embora de modo nenhum possam ser entendidas como a causa da violência, a sua eficácia tem sido reduzidíssima, a avaliar pela propagação do fenómeno, desde que designou de escumalha os bandos de desordeiros que semeiam o caos e a destruição nos bairros periféricos das grandes cidades francesas já de si carecidos de equipamentos e infra-estruturas socias, como insistentemente alegam.
Se a linguagem de Sarkozy não primou pela elegância, mesmo atendendo à exaltação do momento, no contexto degradado em que ela se verificou, pior do que isso, é a sua completa inocuidade, com o acúmulo de danos e vítimas desde esse seu momento de enfado e irritação.
Em quase toda a Europa, sobretudo na União Europeia, desde há anos que os factores da desordem social não cessam de se multiplicar, com a inconsciência criminosa dos que têm a responsabilidade de prever as suas consequências.
O chamado mundo moderno, globalizado, que reduz as Nações e os seus cidadãos a meros conjuntos ou segmentos de mercado, tão-só consumidores, não tem encontrado tempo ou razão para se preocupar com este tipo de problemas.
Primeiro, minimiza-os, acha que eles se resolverão com a próxima retomada do crescimento económico; depois, conforma-se com o declínio demográfico dos seus países, encarando a imigração como panaceia universal para a escasez de mão-de-obra, dentro de uma visão julgada pragmática que não vê na população senão um factor de produção necessário para promover o crescimento económico. Melhor ainda se ela se mostrar disponível, barata e sem direitos sociais.
Entretanto, a inconsciência vai-se generalizando. Na dormência do consumo incentivado, ninguém parece importar-se com os tipos de sociedades que se estão a desenvolver. Serão o quê ? Nações ? Comunidades ? Estados ?
Que tipos de sociedades criamos, na base do multi-culturalismo exacerbado, sem respeito por referências comuns ? Onde ficou, que destino levou, o sentimento de pertença a uma Comunidade assente no culto de um passado comum ? Serão exequíveis os Estados baseados em tão dilaceradas Nações, com acirrados ódios entre si, desprovidas de sentimentos de solidariedade recíproca ? Não se justificaria rever cuidosamente as leis da Nacionalidade, no seio da União Europeia ? Que sentido fará chamar «francês» a quem não partilha nenhum traço de identidade cultural com outros franceses, nomeadamente, com os de origem ? A chamada globalização dos mercados terá resposta adequada para estes problemas ?
Eis alguns dos temas que aqui na União Europeia, sobretudo, deveriam constituir prioridade absoluta nas reflexões sociais que os Governantes costumam enaltecer, pelo menos, no plano teórico.
Sirva-nos a nós todos, europeus, cidadãos desta delicada União Europeia, de séria advertência o que se tem passado em França na última quinzena, se queremos evitar a temida confrontação generalizada entre comunidades.
Lembremo-nos de que, pese o precipitado vaticínio do mediático Fuckuyama, ainda não chegámos ao fim da História...
AV_Lisboa, 07 de Novembro de 2005